Em um movimento silencioso, porém carregado de impacto, o governo federal prepara uma medida provisória para acabar com a isenção das Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA). Na superfície, o discurso é nobre: aumentar a arrecadação, corrigir distorções e promover justiça tributária. Mas por trás da retórica tecnocrática, esconde-se uma armadilha que pode afetar profundamente a relação do brasileiro médio com o investimento, o crédito e, principalmente, com a confiança no Estado.
As LCI e LCA surgiram como incentivos claros a dois setores essenciais da economia nacional: o imobiliário e o agronegócio. Em troca da isenção de imposto de renda, o investidor direcionava recursos a essas áreas, garantindo liquidez e fomento sem a intermediação direta do poder público. Era uma lógica de ganha-ganha. O banco captava, o investidor recebia líquido, e os setores produtivos se financiavam.
Agora, o governo quer reverter esse pacto com uma canetada provisória.
É evidente que o Brasil precisa rever isenções injustificadas, especialmente aquelas que blindam grandes conglomerados e beneficiam apenas o topo da pirâmide. Mas LCI e LCA estão longe de serem privilégios dos super-ricos. Ao contrário: são os instrumentos mais acessíveis a quem busca segurança, liquidez e previsibilidade, principalmente os pequenos investidores que fogem dos riscos da renda variável e não confiam mais na poupança.
A medida, se confirmada, representará um desestímulo direto ao financiamento privado do agronegócio e da habitação — justamente dois motores estratégicos da economia brasileira. Além disso, provocará uma migração abrupta de investidores para outros produtos, ou para a renda fixa tradicional, sobrecarregando ainda mais o Tesouro Nacional e pressionando os juros a longo prazo.
Mas o problema vai além da economia. É institucional. Mudar as regras do jogo no meio da partida, via medida provisória — instrumento que deveria ser reservado a urgências reais —, é mais um exemplo da instabilidade jurídica que afugenta investidores sérios. É o tipo de decisão que queima pontes em vez de construir confiança.
Ao mirar uma arrecadação pontual, o governo pode perder algo muito mais valioso: a previsibilidade do sistema financeiro. Quando a mão do Estado interfere sem diálogo, a mensagem que se transmite é a de que nenhum direito é definitivo, nenhuma promessa é respeitada, e nenhum planejamento é confiável.
A justificativa de “corrigir distorções” não resiste a um exame mais profundo. O Brasil já tributa pesadamente quem empreende, quem consome e quem investe. Se houver distorção, ela está no topo, nos mecanismos de elisão fiscal internacional, nas fundações milionárias blindadas por privilégios, e não no CPF de quem aplica R$ 10 mil numa LCI para garantir a entrada do primeiro imóvel.
O que está em jogo não é apenas um produto de investimento. É o próprio compromisso do Estado com a estabilidade e a racionalidade econômica. E se esse compromisso pode ser desfeito por uma medida provisória, então o problema não é a isenção — é o modelo de gestão.
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